quarta-feira, 1 de agosto de 2012

A Castração e a pulsão de morte na infância e a obra fotográfica de Mokhorev. .

A fotografia é uma das expressões artísticas que, assim como o cinema, sofreu grandes transformações nos últimos vinte anos, passando a apresentar uma forma tão distinta daquela que possuia no fim do século XX que não se pode dizer que se trata da mesma forma de se expressar artisticamente. A fotografia e o cinema tornaram-se arte de domínio coletivo e isto se "revela", para usarmos um termo aplicável às duas formas de arte que maior paixão vem despertando nestes dias de hiper modernidade, de forma desconstrutora, esmagadora e uniformizadora, onde tanto o instante congelado quanto a câmara lenta, revelam e não mais ocultam, como faziam antes, a angústia que nos causam a efemeridade e a futilidade de nossos instantes.
Nossas vidas não são mais para serem vividas na dolência compassada dos tempos idos, onde a morte era somente uma passagem da existencia e não o espetáculo midiático que vemos hoje, e a vida era composta de longos períodos de convívio. A infância, enquanto período protegido das amarguras humanas se prolongava até aos 17-18 anos, mesmo para o menino que trabalhava desde cedo no campo onde a dureza e a rudeza dos dias consumiam a carne e a sensibilidade da alma se esvaía como areia entre os dedos.
A fotografia de Mokhorev desnuda diante dos nossos olhos uma infância em branco e preto, sem as cores que seriam apropriadas para os sorrisos de meninos e meninas. Mas em sua arte, principalmente nas fotos capturadas na Moscou pós muro de Berlin,  a infancia não sorrí pois já não existe. E esta des-infancia não é só dos meninos russos mas também das crianças brasileiras.
   No Brasil pós Lula temos duas infâncias que negam a sí mesmas a identidade de infante no sentido plástico e idílico daquela criança que tinha tempo para pular corda e amarelinha, rir alto e não ter medo de peguntar ao mundo adulto o que é isso ou aquilo. A infância da classe média alta que paga escola particular com plano de saúde e transporte com ar-condicionado e monitor e a des-infância dos meninos e meninas da baixa classe média das periferias que frequentam escolas particulares com professores que no outro período de trabalho atuam na escola pública e por fazerem dupla jornada de trabalho não podem acompanhar a desconstrução da informação a qual seus alunos, tanto os da escola pública (mesmo com menor possibilidade) quanto os da escola particular da periferia, se defrontam, constroem, elaboram, consomem e são consumidos em celulares, Iphones, mini-tablets e páginas de convívio social cada vez mais plástico, asséptico e por isso mesmo violento, preconceituoso e consequentemente fútil e idiota. 
   É neste sentido que a pulsão de morte se desloca do rompimento do cordão umbilical, da perda do conforto uterino para a execração pública, o bulling, a homofobia, a xenofobia e ao fim, a morte pura e simples, seja ela real ou virtual. A morte virtual não sangra (coisa que decepciona o consumidor voraz pelo líquido pastoso vermelho que jorra da jugular do outro (basta ver as partidas de futebol infantil assim como os do campeonato televisionado) -desde já chamo a atenção para o sucesso dos vampiros, monstros e duendes que sugam vidas, mesmo que de forma romantica em tons pasteis em filmes, fotos (estas aos milhares nos Facebook's) e perfís que nem sempre são aquilo que seus teens representantes dizem ser) ao contrário da morte real que choca e faz vender mercadorias e aplicativos.
A fotografia de Mokhorev e a filosofia psicanalítica de Freud de certa forma se intercalam para responder às nossas angústias dinte do inesplicável mundo em que vivem nossas crianças. Um mundo onde o adulto é o bobo da corte que diverte por sua completa idiotice e estupidez. 
    Tanto professores das escolas particulares quanto das escolas públicas das períferias enfrentam a mesma angústia diante do uso abusivo da tecnologia por seus alunos em sala de aula. Não sabemos mais o que fazer para dividir a atenção (ou conviver com a falta dela) com celulares das centenas de modelos diferentes- algúns inclusive lembram brinquedos) e de forma produtiva restabelecer o convívio em sala de aula.
  Imagem: fotografia de E.Mokholev. Fonte: http://revistafotomania.com.br/blog/item/406-evgeny-mokhorev-a-grande-revela%C3%A7%C3%A3o-russa-da-fotografia

  

quarta-feira, 11 de julho de 2012

A fotografia.

Minhas mãos construiram esse país
minhas pequenas maos quando ainda não sabiam
segurar o lapis
já capinavam o capim
já trocavam o parafuso da roda
do capital do mundo.
Imagem: Dorothea Lange.Fonte: https://readreidread.wordpress.com/2011/05/26/happy-birthday-dorothea-lange/

sábado, 23 de junho de 2012

através das estrelas

caminho pelo céu
em pêlo com os pés
nas nuvens de cabeça.
Vejo você junto ao Criador.

Imagem: Leite milk de Anne Wardrope Brigman. Fonte:http://pinkneptune.milkboys.org/

sexta-feira, 22 de junho de 2012

não aguento mais

não suporto mais o cinismo
de seu sorriso cínico
esse seu jeito de quem
é amigo de Deus.

Imagem: Evgeny Mokhorev, Pistol, Fotógrafo russo que retrata a infância na Russia.
Fonte: http://nicethingsatkajsaanddittes.blogspot.com.br/2011/03/evgeny-mokhorev.html







TUDO DO LADO ESQUERDO

o lago está do lado esquerdo do
peito do lado esquerdo está o 
coração está do lado esquerdo
do peito tem o mamilo do lado direito
do lado esquerdo

Imagem: Kevin Carter, O símbolo da fome e do horror em África. Suan,Sudão, Março 1993. The New York Times. Fonte: http://bitaites.org/artamente/as-varias-mortes-de-kevin-carter/

terça-feira, 12 de junho de 2012

a dor aplacada

traga até minha boca o vaso de veneno que tens em teu coração
talvez assim aplaques a dor que sinto no peito
o fogo que queima minha alma
a solidão da madrugada insone solitária

traga té minha boca o veneno que tens em teus lábios
talvez assim eu morra depressa sem ver a lepra que tens em seu coração
talvez assim consiga sobreviver ao ódio que me dedicas desde o dia que me conheceu
e os amantes enlaçados entre os lençóis talvez
morram de tédio antes do amanhecer
sossegando assim a tempestade e aplacando a ventania
permitindo que as flores à beira do caminho
mostrem-se menos frágeis ao sol da manhã.

Foto: Julie Blackmon. Superman. Fonte: http://www.julieblackmon.com/

É DE MINHA PENA

é de minha pena apenas a pena
são de meus sonhos apenas aqueles
que não se realizam é de minha
é de minha poesia somente
a cinza do morto jogada
n'água dos teus pesadelos

não é poesia o que faço mas somente sementes que jogo aos cães
é veneno que destilo pelos meus dedos somente veneno
nada que alimente sairá de meus lábios não espere que o tempo melhore
as nuvens escurecem e dos teus olhos somente se verá lágrimas tristes
não espere que eu componha um verso que fale de amor
não espere que eu escreva uma carta ao senador e que tudo mude de repente
o mar vai secar e não há nada que eu possa fazer
as estrelas vão cair e não há nada que deus nenhum possa mudar
o destino está traçado e as desgraças que teriam de acontecer pela eternidade
virão todas de uma só vez nesta sua vida desgraçada
não é poesia o que faço mas somente sementes que jogo para as aves de rapina

não é remédio o que trago nos frascos que carrego na alma
é veneno que recomendo que tomes para curar a tristeza do teu riso
não é alegria que estampa minha cara de idiota
não são sinceros os meus votos de felicidade
não é verdade que te amo
meu coração é de pedra pura não cabe nele nenhum tipo de sentimento que mereça
ser descrito em palavras somente as lágrimas das dores dos partos das mães mortas
somente o cheiro de perfume estranho que exala do corpo da prostituta morta
como menino triste que canta canções tristes de botequins são meus poemas
uma prostituta ensinou-me o que é o amor
por isso tenho esse olhar de peixe que morreu
por isso meus amores nunca foram descritos por poetas
por isso minha alma abandonou meu corpo a muito tempo

Não são poemas o que canto
são só frases soltas sem nenhum sentido
por isso homem de negócio nenhum perderá tempo aqui lendo minhas tristezas
vá embora você que veio até aqui e não se esqueça
vomite antes de chegar em casa.

Foto: Martin Munkacsi. Boys running in to the surf a Lake Tanganyika, 1931. Fonte: http://weimarart.blogspot.com.br/2011/06/oh-boys.html


eu sei que meu amor não te basta

eu sei que meu amor não te basta
que nos braços de outras
buscas consolos
que outros lábios te beijam
que outros olhos contemplam os mares
que trazes em teu olhar.

eu sei que neste instante
em algum lugar não muito distante
alguém com as mãos sente bater teu peito
sei que outros dedos tocam
encaracolados teus cabelos
teus pelos macios por outras mãos passeiam
suas faces beijadas e teus abraços em outro abraços

eu sei que o meu amor não te basta
mas minha alma cavalga nos instantes
que estamos juntos diante das núvens
como égua enlouquecida a trotar
por noites enluaradas caminha meu coração
quando chegas e trazes o sorriso do mundo
eu sei que meu amor não te basta
mas meu coração não pode viver sem seus olhos
que vou fazer?
melhor ter dias plenos que uma eternidade vazia
eu sei que meu amor não te basta.

Imagem: Orpheus by Byssen. New York. Carlsberg Kobnhavn Museé.

O mapa do teu coração

mas não conheço o mapa do teu coração
carta náutica secreta escondida
no fundo d'alma lugar proibido
nas madrugadas acordado
de noites mal dormidas
nada e nem ninguém acredita
que o calor desfalece e a febre
desmaia enquanto a dor dilacera
a alma implora por um sorriso
que aplaque a ventania que resseca
no deserto que transforma tudo
em teu abandono.
Foto: Evgeny Mokhosov. 1999. Fonte: http://boymeetsgirlproject.blogspot.com.br/2010/10/evgeny-mokhorev.html

esse país tropical

esse país TROPICAL
sem PUDOR  e sem PECADO
qual MENINO  índio
já nasceu PELADO
esse país de pequeno pobres CANALHAS
esse país de PUTAS
MENINAS de família
essa terra de meninos felizes
que jogam bola e brincam de boneca
esse país é o céu dos canalhas felizes
esse país é o PARAISO das putas e dos desgraçados
esse país tem um DEUS  só pra nós.

Foto: E. Mokhorev. 1999. fonte: http://www.amadelio.com/vlog/tag/evgeny-mokhorev/

Bucólica poética. O lamento ao amigo morto.

de menino me lembro do amigo morto
os nós dos dedos sangrando meu peito
adeus que a viagem é longa CHEGA dar VERTIGEM
Foto: Evgeny Mokhosov. San Pettersburg. 2007. Fonte: http://www.dailystrength.org/groups/teen-kids-speak-out/news/view/1741582

Bucólica poética. O lamento para o amigo morto. (Sonhos de Peter Pan) III

eu sei não poderia ser apenas
AMIGO TEU  seu planeta pequeno
não cabe NOSSO AMOR
não combina comigo sua perfeição
os astros haviam dito
pela boca d'ua cigana
que na palma da mão
o peito vazio jazia.
Foto: Alex Webb. Cenas na Turquia. Fonte: http://www.turkishairlines.com/en-int/skylife/2007/february/cityscope/turkey-through-the-magnum-lens.aspx

Bucólica poética.-O lamento para o amigo morto. (Sonhos de Peter Pan) II

então você viu QUANDO
MINHA ALMA olhou e
do que viu NÃO GOSTOU
seu coração NÃO ERA só meu
os olhos não MENTEM
o que os lábios dizem

PERDOE AMIGO
se não mereço ter seu amor
se não mereço ser seu
não quero ser de ninguém MEU CORAÇÃO


Foto: Alex Webb. Crossings.

Bucólica poética- O lamento pelo amigo morto. (Sonhos de Peter Pan)

não quero ser gente grande
quero não crescer nunca
menino eterno flutuando
pela vida como quem joga
bela bola a vida toda tomar
banho de rio e cachoeira
nossos corpos nús em banho pleno
as roupas ao longe com medo
de sumirem no momento de ver
nossas almas de meninos eternos eternizados
nas pedras e grãos de areia colados
aos corpos alados flutuando.

Foto: Alex Webb. Coleção: Mexico. Tehuatepec. Niño en el arbol.1985.

segunda-feira, 11 de junho de 2012

SE PUDESSE SER SOMENTE PALAVRA MORTA.

a gente não pode ser só palavra morta
mortos continuamos fazendo calar
a serra que corta a madeira atravessada
na garganta da existência em carne viva
assim meu peito não tem paz então choro
rios e mares em silêncio com sina torta
de teu beijo amargo e sem saliva.

Foto: Evans Walker, Testimonial of the Great Depression, Floyd Burrougs and his children. Tengle, Alabama,1936.
Fonte:  http://michelelaird.files.wordpress.com/2010/01/337min1.jpg

DENTRO DO PEITO

dentro do meu peito declamam
declamam poemas os anjos
do poeta morto antes
antes da saida da janela
da janela aberta a cortar
cortar a alma em lâminas afiadas
afiadas no chão de gris pedra
pedra atravessada na garganta lacerada
porque que a gente não pode ser só palavra?

Foto: Evans Walker. Testimonial of the Great Depression.
Fonte: http://byricardomarcenaroi.blogspot.com.br/2011/03/photos-walker-evans-part-1-testimonial.html

A VIDA

a vida começa quando
a mecha mexer no começo
antes da deixa de fazer
o doce de leite amargo
deixado na panela queimado
como tempo passado.

Foto: Oleg Videnin. http://www.videnin.com/portfolio2.html

ABANDONO

Ando pelas ruas andam
vazias elas estão
em reforma a cidade se transforma
as arvores estão sumindo o ar
brota do chão com um medonho
cheiro de árvores mortas.

Foto: Oleg Videnin. http://www.videnin.com/portfolio2.html

EGOISMO

Eu quero agradecer a nós
agradecer a mim mesmo
já que mim me ama
meu umbigo é feliz
o mais feliz umbigo do mundo.


quarta-feira, 30 de maio de 2012

Na Igreja

Um templo sem pastor choram os fiéis
sob a sombra do Altíssimo choram os fiéis
passa o auto em velocidade alta
no adesivo do vidro o deus sorri
na efêmera letargia da cidade

a Igreja

lamentos na igreja
duas portas abertas para o céu
tragam fiéis dizimistas
lamentos do profeta morto
sob o leite derramado
Imagem: Anna Lea Merrit, Love Locked Out, 1889.

Reflexões

do meu ânus sai um poema
que fala de amor
do meu pênis sai um dilema
que fala de dor
como poeira e cago poesia
mas é tanto açúcar e insulina
que meu ânus não aguenta
que as artérias dilatam-se

o coração não bate
o pulso não pulsa
o pênis não levanta
é tanta cafeína e anfetamina
mais uns quantos comprimidos
de ritalina que tudo está controlado
dentro das normas celestiais
o telefone toca
tenho de ser cordial
ou pular a janela
sujar a rua ou outra coisa pior


O Peixe

a estrela mais bonita o menino comia
virava peixe ia-se embora
esquecendo-se das roupas à beira do rio
onde as estrelas vinham beber água

rio

ficar sempre na parte mais rasa do rio
rir quando cai uma estrela na água
tomar banho pelado no rio
frio fora da água

Cântico Novo

Tome uma asa de barata
voando em minha cozinha, cozinhe
um bando de velhos, ao molho
num calhambeque velho
falando besteira na tevê

Nenhuma comida na panela
o arroz está caro
o feijão um veneno
a carne de vaca velha tá de morte
com preço de boi
só me restam as baratas voadoras




sexta-feira, 25 de maio de 2012

a vida

a vida começa
quando termina
a mecha começa
quando a vida começa

Imagem: Kodi Smith McPhee. Deixa ela entrar (Let Come In).

Escrevo torto por linhas certas

o lápis arranha a pele da folha
o sono tarda enquanto o lápis desenha
à flor da pele a folha densa
dança à pele crespa
do poema teu

Imagem: Night Flight. Montagem

CANTICO DOS CANTICOS

queria tê-lo agora para beijar-te
simplesmente teu sono
tarde da noite não durmo
o lápis arranha a pele
da folha tardando o poema
que crespa crispa
por tempos findos
como canção que acaba
foi embora e o sono
cansa o tempo todo


Imagem: Edward Burne-Jones_”Last Sleep of Arthur in Avalon”

CANTICO IV

este poema é uma piada
tudo o que faço vale pouco ou nada
tudo o que tenho é uma filosofia
que não vale um espelho ou uma fotografia
as flores de plástico são
as flores que aprecio
roubo-as do cemitério
adoro as tumbas douradas
que não possuem nomes
aquelas que são monturos
de defuntos esquecidos
os  mortos são os únicos
que merecem meu respeito.

Imagem: Montagem artística.

CANTICO III

meu deus é uma caneca
meu deus é uma boneca
de plástico inflável
meu amor inflamável
não acredito nas guerras não
creio em contos de fadas
não como carne de peixe
não palito os dentes
não penteio os cabelos
não quero festas de aniversário
não quero enterro enfeitado
meu livro é um só poema
minha vida é um dilema
meus filhos eu nunca ví
vivo na terra do sol a pino
onde chifre e miolo derretem


Imagem: Kodi Smit-McPhee. Montagem sobre fotografia.

CANTICO II

não sei falar de amor
não vou falar de amor
não sei falar de amor
nunca fui amado
tudo o tenho é dor

meu nordeste
não tem música
meu leste não tem sol
meu sul
não tem vento frio

minha terra não é terra
meu país não é país
meu povo não é povo
minha gente não tem dente
aqui ningém sente inspiração
de poeta quem tem comida
não tem meta de barriga vazia
perdeu a reta quem teve meta.


Imagem: Garotos balançam em árvores no Central Park de Nova York, Estados Unidos. A foto integra uma coletânea de imagens de fotógrafos famosos e embaixadores da ONU que registram a situação dos direitos da criança pelo mundo.

quarta-feira, 23 de maio de 2012

SÓ EU

Só eu sei dos tolos
que encontrei nos caminhos
só eu sei dos sonhos
que sonhei em pergaminhos
mas o seu sorriso
salvou-me da agonia
e ainda hoje me lembra
a infância dos sonhos
distantes todavia

































Imagem: Bernard Mybung. Hedhairedang.


segunda-feira, 21 de maio de 2012

o feto

o fato do teu feto
ser afeito ao afeto
não faz sentido

Imagem: Fernand Allard L'Oliver (1883-1933- Belgica) , Allegorisch Tarereel.

Essa terra

essa terra não tem meta
não tem poeta essa terra
só tem mata essa terra
derrubada floresta queimada
essaterra que cheiro
que nada só fumaça

essa terra não inspira
quase não saio poeta
quase não gosto do que vejo
prefiro meu quarto inteiro
rezo deitado sob a lama
neste quarto triste desanimado
por completo morto

já rezei o alfabeto
do teu corpo abstrato
que revelou-se indecente
quimera inclemente
fera movente morte
de poeta é sorte.


Imagem: Renato Guttuso, Boy and Lizard, 1978.


homem velho

a velhice faaz feio o homem
nos mostra a cara entorpecida
entristecido olhar da face
enrugada de sorriso esquecido

só os malvados ficam velhos
os jovens morrem antes
de tristeza e dor

glória nenhuma há na velhice
desonra somente o velho ser
bastardo de sí mesmo
o tempo nos faz falsos
dissimulados
a feiura fere a pele do velho


Imagem: Anna Lea Merrit, Love locked out, 1889, London Gallery.

Os gritos histéricos dos santos

"Quando você for jantar com alguém importante, não esqueça quem ele é. Se você é guloso, controle-se. Não tenha pressa de comer a boa comida que ele serve, pois ele pode estar querendo enganar você. (Pv.23:2)

na igreja as verdades
são ditas aos gritos
sussuros obrigatórios
no céu entre santos
o pecado é consagrado
não deve ser alardeado
o pecador ficará chateado.

Imagem: Albert Samuel Anker, Die Knochelspieler, 1864, Museu Gruerien, Suiça.

vôo final de Osíris

desenfreada e louca a vida
coragem desenfreada pela vida
lutar é a única razão de viver.


Imagem: Christian Wilhelm Allers, Pompejanischer reigen n°3, 1913.

minha reza

com você aprendi a rezar meu credo
toda noite rezo
meu sexo
com minhas mãos.

Imagem: Esteban Alessa , The incestuous lover, 2006.

Meu protesto

meu protesto é contra
a estética já que meu poema
não tem ordem
minha vida alfabética
mesquinha doença diabética


Imagem: Christian Wilhelm Allers, óleo sobre tela, Boy, 1913.

sexta-feira, 18 de maio de 2012

o que nos separará do amor de cristo?

nem a morte e nem a vida
nem os anjos nem os arcanjos
nem o presente e nem o presunto

poesia ou comida

poesia é comida para ser consumida
poesia é comida para ser comida
depois de cem anos de ser colhida
não escrevo para as bestas do campo
não escrevo para as bestas urbanas
escrevo para vocês que estão aí
cem anos antes do nascer do sol

Imagem: Pierre Bonnard. Charles et Jean se baignant, Robert pres du bassin, 1899.

no buraco

no buraco que chamo de casa
onde escondo meu corpo
do olho do outro
tem um cheiro de urina de rato
cheio de teias de aranha
de caminhos de caminhar
baratas e formigas

não há detetive
que detetize a nojenta
poeira dos livros apodrecendo
quem pensa que pensa não aguenta
o cheiro de bosta de rato

há uma sociedade organizada
de animais minúsculos
que vivem em minha casa
embaixo da minha cama
estao em constante reunião
em discursos inflamados
reunidos em assembléias
filiando-se em partidos
organizando religiões.

frequentam lugares frio e quentes
lugares húmidos e secos das dobraduras de meu corpo
é um lugar organizado com câmeras de vigilância a postos
com soldados postados em prontidão
nas esquinas dos dedos das mãos e pés

a guerra dos insetos começou
já teve início o controle de natalidade
há um ar de paranóia no ar
a terra está em transe
algo vai acontecer
meus intestinos já pressentem
o fim do mundo chegou.


Imagem: Margaret Bourke-White. Moscow, Russia, 1941.

O TOURO MECÂNICO E O ROBÔ ATÔMICO

vim ao mundo na hora errada
nascí antes do tempo marcado
como rebento prematuro
faltando osso no cérebro
crescí entre macacos
que jogam bolotas
no meu casco azul nasce fungos
tadas as vezes que falo errado.

mas não importo-me com isso
sei que não sou daqui
apesar de tentar viver entre mamíferos
tenho o sorriso da galinha
que viu o pássaro voar
que viu o passado
virar caco de vidro
da vidraça quebrada
pela estatua do santo
do aleijadinho

em pé resito às tempestades
que assolam o casco da nave que me leva
do navio que voa à plenos ares
enquanto da janela sorri a moça
que cavalga o touro mecânico
do rodeio infernal que é a vida de quem não tem ninguém

mas como disse desgigo
o dito interdito do santo
que abandonou a batina deixando
a beata besta da vida
enfurecida com o mendigo abandonado
na esquina tem um doente mental
que grita Aleluias ao deus de jerusalem
belem, belem, belem
para anunciar o evangelho
no deserto da judéia lá de casa
em parceria com o robô atômico colorido
com hálito de naftalina.


Imagem: Anne Wardrope Brigman, Stardust.

Oração

Senhor, faça nascer um câncer no reto, na cloaca
dos pastores homofóbicos
que uma hemorróida enorme os consuma a todos
desde as entranhas
que dos cús dos pastores homofóbicos
nasçam pústula fétidas
e se encham de picas enorme do deus daganin
que o pinto do deus daganin
preencha o reto dos pastores homofóbicos
preencha o reto dos senadores homofóbicos
preencha o reto dos deputados homofóbicos
preencha o reto das pessoas comuns homofóbicas
que o ânus homofóbico caia e no lugar nasça uma ferida medonha
daquelas das chagas do Egito
das maldições de Babilônia
das feridas de Faraó

que do cú dos presidentes homofóbicos
saiam serpentes que lhes comam a língua
Ò Senhor Deus dos desgraçados
dizei-me ò Deus
quando os cús dessa gente vai cair.

Colabore com as crianças
http://gabrielpollaco.blogspot.com.br/2012/03/luta-de-mais-uma-mae-para-cuidar-do-seu.html

Imagem: Juan Buhler J., Barcelona, 2005.

A pastora de Daganin

A pastora de Daganin
serve ao deus daganin
o pênis de daganin
tá no cú da pastora de daganin

A vagina da pastora de Daganin
ferve ao som da dança de Daganin
Daganin é o deus da dança
da pastora de Daganin
Daganin, deus das planícies
enfia o pênis na vagina da pastora de daganin
que está no altar de daganin
o pênis de daganin
penetra o ânus da pastora de daganin

http://www.youtube.com/watch?v=yXCgqlxKuwQ

O deus de cú de fora

O deus do cú de fora está com o cú de fora
o deus do cú
do pastor homofóbico
está no cú do pastor homofóbico
sujo de bosta
porque saiu do cú
do pastor homofóbico.

o deus do cú
do pastor homofóbico
tá sujo de merda
do cú do pastor homofóbico
do cú do pastor homofóbico
do cú
do cú
do cú, cú, cú, cú, ..., ..., ...,

Imagem: Balys Buracas. Crianças de Vila Lituana.  

A estrela Vésper (William Blake)

Louro anjo vespertino, agora enquanto o sol
repousa na montanha, acende o teu brilhante
Facho de amor; na fronte a lúcida coroa
Cinge, e sorri à nossa alcova adormecida.
Sorrí ao nosso amor! e enquanto descerrares
o cortinado azul do céu, derrama o argênteo
Orvalho em cada flor, cujos olhos se fecham
Ao sono. Faze o vento adormecer no lago.
Pede silêncio com teus olhos bruxuleantes
E lava a escuridão com tua prata. Em breve,
Em breve partirás: feroz já uiva o lobo
No descampado e ronda o leão na mata escura.
O velo do rebanho está coberto com
Teu santo rorejar: que tua influencia o ampare!

W. Blake foi o mais importante poeta do século 19 que soube transpor para as letras e a arte toda a angústia de uma alma atormentada pelo convívio social conturbado em um mundo onde o indivíduo é reduzido à mais ínfima parcela diante da monstruosidade do sistema produtivo que nos sufoca e oprime.
Veja também o clipe abaixo e pense no Louro anjo vespertino trazido pela estrela Vésper.

http://www.youtube.com/watch?v=7H4NwKxSTEs&feature=relmfu


Imagem: William Blake. Satã observando o amor da Adão e Eva.Museu de Belas Artes. Boston. USA.

quinta-feira, 17 de maio de 2012

não me pareço

não me pareço
com ninguém
que eu conheço
nem comigo mesmo
o sujeito que está lá em casa diante do espelho
não sou eu que estou lá em casa diante do espelho

Imagem: Evgeny Mokhorev. Myha u zerl.

Operário

operário da construção
músculo moldado emoldurado
pelo concreto torso nú
enegrecido pelo sol do dia a dia
na luta insana pelo pão
na vã filosofia da força bruta
suor do dia todo
todo dia

torso nú de mão calejada
carinho bruto que lamenta
sua eterna ausência
da mulher amada na pedra lapidada
a sangue e suor
da paixão desgraçada
cumprida a tiros

Imagem: Evgeny Mokhorev, sem título, famoso fotógrafo russo, nascido em Leningrado-1967.
Veja mais em:  http://nailyaalexandergallery.com/artist/evgeny-mokhorev



Você está bem demais

hoje te vi passando por acaso (passando)
rua a fora seus cabelos ao vento
lisos eram como pessoas correndo
seu corpo leve flutuando deslizava pela rua
em meus sonhos mais felizes não te vi assim
do tempo que desatina e alucina meu cérebro
no alvo da pele de teu ventre
nos pêlos ao toque da ponta dos meus dedos
dentro do teu umbigo tem um rio que molha
a rua da minha casa
ví você virando a rua
então acordei sentado olhando a pedra entre meus pés.

Imagem: George MORHAM, Waverley Market, Edinburgh, UK, c. 1885.

Anjo decaído. O menino triste

mantem tao inclinada a cabeça
ninguém olha-lhe os olhos se olhassem
veriam o inferno dentro d'alma
são como animais e vivem do lixo
mas alimentam o luxo com seus afetos
das meninas sujas que depois de um banho
perfumadas filhas da classe média que passa
de vidro levantado e ar ligado no sinal

Imagem: MUCHA, Alphonse Maria (1860-1939). Sem Título.

anjos decaídos. Nova Visão

como anjos decaidos caminham
pela terra que não deu-lhes a paz
caminham sem rumo pela terra que os pariu
meninos e meninas olham o vazio
e ante do amanhecer tudo volta ao normal
o futuro foi antes de ontem
morreu despedaçado na calçada em frente àquele Banco
ninguém viu foram todos ao mercado comprar peixe
para a festa de são joão menino
não aconteceu nada foi
só um sonho que não aconteceu
foi só um susto
já passou


Imagem: Eadweard Muybridg, A Summer day's Sport, 1880.


anjos decaídos. o retorno

de repente num lampejo
olha a alma sai correndo
alha a arma e já não há tempo
o fogo que mata atravessa
o peito nu de encontro ao vento
cai ao chão manchado de vermelho
o menino pálido atrapalha o transito
caído na rua onde os carros passam apressados
o sangue fertiliza o solo
mancha a terra dos homens que não se amam

Imagem: Eadweard Muybridg (plate 167, from animal locomotion. Jumping over a boy's back - leap-frog. 1884-1885.)

Anjos decaídos capitulo 2

não querem proteção
não querem coração
querem o monstro
fumam o monstro
bebem o monstro
aplicam em suas veias o liquido do monstro
finas e delicadas ruas azuis no escuro da noite
da noite aveludada de drogas facilmente encontradas
nas ruas escuras das noites frias e escuras
nos braços finos de menino ainda
perfurados pelas agulhas das dores maternais
olham o olhar perdido de criança sem mãe e sem pai
vendem o corpo em troca de uma nova alma
de uma nova arma

 Warren Cup ( copo de prata) Presumidamente do periodo da Dinastia Julio-Claudiana no século I a.C.

ANJOS DECAIDOS

como seres inanimados
caminham eles e elas
pelos becos e ruelas
maltrapilhos e rasgados
com suas genitálias expostas
as meninas drogadas do meu bairro
os meninos drogados do meu bairro
acalentam sonhos de senhores
que lhes dão parcas moedas
para mais uma viajem
por um pouco de sonhos
psicodélicos

os meninos não brincam
os meninos brigam
os meninos matam-se como animais
são homens sem pêlos sem tê-los
desprovidos de pele que os proteka
não necessitam de proteção não
há que os proteja
não há que os queira
Imagem: Warren Cup (Copo de prata) Presumivelmente pertencente ao período romano, muito provável da Dinastia Julio-Claudiana sec. I A.C. Mais informações: http://en.wikipedia.org/wiki/Warren_Cup




o futuro está do outro lado da parede

do outro lado da parede do quarto da casa que vivo
já é o futuro de outro tempo que não serei
lá as gentes lê livros que flutuam no ar
árvores de plástico com motores invisíveis em seus miolos
exalam um perfume poético para que vivam melhor a vida
as mulheres vestem vestidos transparentes
delineando suas curvas encomendadas
com modificações genéticas melhoradas como
as santas de ontem flutuam no ar
pairam sobre o solo e são admiradas como deusas gloriosas
todos querem tocá-las mas não o fazem
são proibidos pois as mulheres são intocáveis deusas flutuantes
elas decidem a quem dar o seu amor e derramam
sobre o escolhido seus beijos adocicados

são amantes desde o dia que nascem
são amantes desde o nascimento
o hímen inexistente flutua nas nuvens das chuvas ácidas
barreiras de um passado distante

Imagem: Oleg Videnin, (fotografo russo)




Adão no paraíso (Garden of Evil)

Bebi o sêmen e comi a semente
comi a fruta e a semente dentro
serei castigado por Deus
o néctar dos deuses era
para os deuses e o manjar
dos deuses era somente o manjar
comí o manjar e o maná de Deus
de Moisés no deserto e
o corpo de cristo na ceia
do sangue crucificado e
o proprio deus entristecido
na cidade celestial
descendo por minha garganta
boca a dentro
o sêmen e a semente
da fruta proibida todo
o prazer de deus
sorvido em minha boca
palato duro tragado

Imagem: WALKER, Evans, (Sharecropper Bud Fields and his family at home, Hale County, Alabama, 1936)